Resumo O presente estudo tem como objetivo uma breve análise de como as modernas tecnologias de comunicação têm sido utilizadas para influenciar as decisões de um número indeterminado de pessoas. Um objetivo adicional é realizar uma avaliação sobre a nossa capacidade de efetuar uma apreciação crítica dessas tentativas de persuasão. Grandes empresas têm se valido dessas novas tecnologias para atingir um novo patamar no capitalismo, aproveitando informações fornecidas irrefletidamente pelos usuários da Internet: é o que se convencionou chamar de capitalismo de vigilância. Dados relativos à navegação apontam necessidades e preferências, informações essas que se tornam um valioso material a ser objeto de comercialização por parte das detentoras desses dados, o que tem influenciado sobremodo nosso comportamento como consumidores. Além desse tipo de influência nos hábitos de consumo, a Internet também multiplicou a quantidade de vozes influenciadoras da sociedade, seja por intermédio da linguagem oral, seja por meio da linguagem escrita. Apesar da produção de muito material de qualidade, é fato que a Internet também multiplicou o alcance e o potencial estrago que dados falsos ou falsas conclusões podem causar, em prejuízo da verdade e até mesmo do Estado democrático de direito. O ser humano se separa dos demais seres do reino animal por sua capacidade de raciocinar. Entretanto, é inegável que o processo mental do raciocínio lógico é uma habilidade que, como qualquer outra, precisa de treino e aperfeiçoamento constantes. Já na Antiguidade, Aristóteles estabeleceu as bases para o pensamento lógico. Ao longo dos séculos, tivemos outros grandes pensadores que também nos deram importantes contribuições quanto ao desenvolvimento da capacidade crítica, dentre os quais podemos citar René Descartes e Schopenhauer. Este trabalho pretende expor algumas das formas pelas quais os indivíduos podem ser manipulados pela exploração de estratagemas argumentativos e apresentar algumas estratégias de treinamento do raciocínio lógico para auxiliar na identificação de pseudoargumentos que podem levar a conclusões baseadas em inverdades. Palavras-chave: Capitalismo de vigilância. Manipulação. Fake news. Falácias. Raciocínio crítico. Abstract/Resumen/Resumé The present study aims at a brief analysis of how modern communication technologies have been used to influence the decisions of an undetermined number of people. An additional objective is to carry out an assessment of our ability to make a critical evaluation of these attempts at persuasion. Large companies have used these new technologies to reach a new level in capitalism, taking advantage of information provided thoughtlessly by Internet users: it is what has been conventionally called surveillance capitalism. Data related to navigation point out needs and preferences, information that becomes a valuable material to be commercialized by the holders of these data, which has greatly influenced our behavior as consumers. In addition to this type of influence on consumption habits, the Internet has also multiplied the number of influential voices in society, either through oral language or written language. Despite the production of a lot of quality material, it is a fact that the Internet has also multiplied the scope and potential damage that false data or false conclusions can cause, to the detriment of the truth and even the democratic rule of law. Human beings separate themselves from other beings in the animal kingdom because of their ability to reason. However, it is undeniable that the mental process of logical reasoning is a skill that, like any other, needs constant training and improvement. Back in Antiquity, Aristotle laid the foundation for logical thinking. Over the centuries we have had other great thinkers who have also made important contributions to the development of critical capacity, among which we can mention René Descartes and Schopenhauer. This work aims to expose some of the ways in which individuals can be manipulated by exploring argumentative stratagems and present some training strategies for logical reasoning to assist in the identification of pseudo-arguments that can lead to conclusions based on untruths. Keywords/Palabras-claves/Mots-clés: Surveillance capitalism. Manipulation. Fake news. Fallacies. Critical reasoning. 1 Introdução ao tema Aristóteles foi um filósofo grego da Antiguidade, nascido em Estagira, que viveu entre os anos 384 e 322 a.C.[1] Teve uma expressiva produção literária, na qual tratou dos mais diversos assuntos, tendo chegado até nós algumas obras completas,[2] de outras apenas fragmentos e ainda um conjunto de escritos apócrifos. No Órganon,[3] estabeleceu as bases para o pensamento lógico. Já na Era Moderna, para o desenvolvimento do racionalismo, tivemos a contribuição de Descartes (1596-1650), com o Discurso do método.[4] Desde cedo, seus estudos se voltaram à concretização de seu desejo de “aprender a distinguir o verdadeiro do falso”[5]: Filosofia de Descartes: No Discurso sobre o método, Descartes afirma que sua decisão de elaborar uma doutrina baseada em princípios totalmente novos procede do desencanto em relação aos ensinamentos filosóficos que recebera. Convencido de que a realidade inteira respondia a uma ordem racional, pretendia criar um método que possibilitasse alcançar, em todo o âmbito do conhecimento, a mesma certeza que a aritmética e a geometria proporcionavam em seus campos. De grande relevância para o tema, já na Idade Contemporânea, foi a contribuição de Schopenhauer (1788 a 1860),[6] que tratou do tema em um livro sob o curioso título de Como vencer um debate sem precisar ter razão em 38 estratagemas (publicado em 1864, post mortem).[7] Deve-se ressaltar a importância do desenvolvimento do senso crítico, especialmente nestes tempos atuais, nos quais vemos a proliferação de indivíduos de poucas luzes, ou mal-intencionados, divulgando ideias despidas de verdade, mas capazes de influenciar o comportamento de um sem-número de pessoas inaptas a uma refletida compreensão da realidade. Essa influência negativa pode ocorrer nos mais diversos campos, tais como no consumo de produtos e serviços, na cultura e no comportamento e até mesmo na política. Quanto às armadilhas que a crença no “próprio bom senso” pode nos pregar, transcreve-se excerto de Descartes, que apreendeu de modo magistral essa particularidade da natureza humana: O bom senso é a coisa mais bem distribuída do mundo: pois cada um pensa estar tão bem provido dele, que mesmo aqueles mais difíceis de se satisfazerem com qualquer outra coisa não costumam desejar mais bom senso do que têm. Assim, não é verossímil que todos se enganem; mas, pelo contrário, isso demonstra que o poder de bem julgar e de distinguir o verdadeiro do falso, que é propriamente o que se denomina bom senso ou razão, é por natureza igual em todos os homens; e portanto que a diversidade de nossas opiniões não decorre de uns serem mais razoáveis que os outros, mas somente de que conduzimos nossos pensamentos por diversas vias e não consideramos as mesmas coisas. Pois não basta ter o espírito bom, mas o principal é aplicá-lo bem. As maiores almas são capazes dos maiores vícios, assim como das maiores virtudes, e aqueles que só caminham muito lentamente podem avançar muito mais, se sempre seguirem o caminho certo, do que aqueles que correm e dele se afastam.[8] Como revela o filósofo, de modo geral, todos acreditam ter bom senso e a capacidade de discernir entre o certo e o errado. Entretanto, talvez esse pensamento encerre mais ingenuidade do que uma efetiva percepção da realidade. Consoante se pretende demonstrar ao longo desta exposição, nem tudo é o que parece, e a manipulação de nossas opiniões é uma realidade mais presente do que ingenuamente supomos. Pretende-se analisar alguns aspectos factuais, extraindo-se algumas conclusões. 2 Informação como expressão econômica Dentre as formas tradicionais de expressão econômica, temos a propriedade territorial, urbana ou rural, bem como a produção, a distribuição e o consumo de bens e serviços. Presentemente, ainda mantemos todas as antigas formas de expressão econômica, mas agregamos umas tantas outras. Dentre as novas expressões econômicas, merece especial destaque a informação. Talvez essa seja hoje a maior riqueza de que dispomos. A transformação da informação em riqueza só foi possível após um longo processo de desenvolvimento de nossa capacidade de armazená-la, classificá-la e manipulá-la em conformidade com determinados objetivos. E essa informação diz respeito a dados relacionados aos interesses dos usuários de Internet, seja na utilização de jogos eletrônicos online, seja na realização de compras, pesquisas, aprendizado, relacionamentos afetivos ou profissionais e quaisquer outras interações possíveis, captados pelas grandes empresas do ramo. Todas essas interações podem gerar dados relacionados a aspirações a serem satisfeitas mediante a oferta de produtos ou serviços, sujeitos a serem colacionados e armazenados automática e eletronicamente. Quem já acessou algum produto qualquer em algum site de compras sabe o que isso significa. Os algoritmos da inteligência artificial o identificam por meio dos cookies[9] da página de acesso, reconhecem seu computador pelo endereço IP[10] e, a partir dali, cada novo acesso seu é povoado de propagandas comerciais de produtos semelhantes ou relacionados àquele “visitado”. Esse conjunto de informações possui um valor econômico, na medida em que os seus desejos, expressos por uma inocente pesquisa na Internet, identificados e catalogados por poderosos mecanismos de busca, tornam-se uma mercadoria de elevado interesse das empresas de venda pela Internet. É isso mesmo: os seus desejos ocultos e talvez jamais revelados em comunicação tradicional-verbal com quem quer que seja agora são uma valiosa mercadoria comercializada à sua revelia. Sobre o tema, cumpre destacar o trabalho da economista e socióloga Shoshana Zubof,[11] que trata do capitalismo de vigilância. As grandes empresas de Internet tiveram um insight: todos os usuários de Internet deixam um “rastro” de sua atuação na rede. Suas áreas de interesse, seus gostos, suas preferências de toda ordem, desde sexuais, passando pelo perfil de compras e até mesmo tendências políticas, agora são informações possuídas por empresas economicamente interessadas. Antes, todo esse material era simplesmente descartado, haja vista que era um subproduto sobre o qual ainda não havia sido despertado o desejo econômico. Todavia, começou-se a perceber que essas informações seriam importantes para muitas empresas. A partir da análise desses dados, seria possível identificar gostos e até mesmo prever comportamentos. Não é difícil identificar algumas das manifestações dessa “vigilância” a que estamos submetidos: a) o indivíduo acessa alguns sites de compras em busca do melhor preço de um determinado produto. Imediatamente depois, passa a ser sistematicamente bombardeado com publicidade sobre aquele mesmo produto, seja por intermédio da loja em que foi feita a pesquisa, seja de outras empresas que oferecem o mesmo produto ou produtos similares; b) quando se está pesquisando sobre algum produto, imediatamente a empresa começa a lhe apresentar produtos que de alguma forma se relacionam com o objeto de sua pesquisa, com a seguinte observação: “quem viu este produto ‘x’ acabou comprando ‘y’”, ou então outra congênere: “Frequentemente comprados juntos”, com uma relação de produtos relacionados de alguma forma com o objeto de pesquisa. Cabe aqui recordar um famoso caso da equipe de analistas de consumo da empresa varejista americana Target, que se tornou capaz de identificar padrões de comportamento associados à gravidez[12]: A equipe de analytics da Target, uma das maiores varejistas dos Estados Unidos, notou que havia certo padrão de consumo no evento de uma gravidez, como, por exemplo, a compra de loções sem essência, sabonetes sem cheiro específico, além de suplementos alimentares como cálcio, magnésio e zinco. Na realidade, para ser mais preciso, a equipe de estatísticos da Target definiu uma cesta de 25 produtos que mulheres grávidas costumam comprar. Dessa forma, era possível até estimar a probabilidade de gravidez (de 0 a 100%) e, inclusive, o estágio da gravidez em que a mulher se encontrava (em semanas). Com isso em mãos, a Target enviava às “potenciais mamães” cupons de descontos e ofertas já personalizadas para o período da gravidez em que elas estavam, tendo em vista o modelo preditivo construído. Foi tudo muito bem, até que um homem enfurecido entrou em uma loja da rede varejista, próximo a Minneapolis, querendo explicações para o envio de cupons de desconto de produtos relacionados à gravidez para sua filha adolescente. Segundo o pai, a filha, que ainda estava no ensino médio, sequer precisava daqueles produtos, e esse tipo de oferta poderia incentivar a gravidez precoce. O gerente da loja desconheceu o fato e buscou acalmar o homem. Conferiu com a sede da Target e apurou que de fato houvera o envio de cupons relacionados a roupas para gestantes, móveis para recém-nascidos e fotos de bebês sorridentes. O gerente se prontificou a ligar para o cliente enfurecido e pedir desculpas em nome da empresa. Contudo, pouco tempo depois, foi a vez de o pai ligar para a loja em Minneapolis e pedir desculpas sinceras. Segundo ele, “ocorreram eventos em sua casa envolvendo sua filha que ele desconhecia”, e o nascimento do neto estava previsto para o mês seguinte. Dessa forma, meio que sem a intenção declarada, a Target criou um modelo estatístico que previa com bastante acurácia a gravidez, mas que, por outro lado, poderia gerar desconfortos em algumas famílias. [...] Portanto, a Target, que possui mais de US$ 73 bilhões de receita por ano, utilizou os padrões de consumo de seus clientes para incrementar seus resultados com inegável êxito. O que percebemos é que a utilização dos paradigmas de consumo permitiu, em um momento inicial, que as empresas pudessem ofertar o mesmo produto procurado pelo cliente, já que identificada aquela necessidade. Em um segundo momento, resolveram aproveitar aquele interesse específico para lhe oferecer produtos relacionados. Em um terceiro momento da evolução da análise desses dados, passaram a prever comportamentos futuros, mediante a análise de padrões de comportamento. E essa informação é um produto valioso. 3 Influência comportamental Se a capacidade das grandes empresas comerciais na Internet de influenciar nosso comportamento como consumidores já é algo surpreendente, é realmente assustador descobrir o poder que grandes empresas possuem para nos influenciar em outras áreas. O documentário O dilema das redes[13] nos traz um panorama bastante preocupante sobre a fragilidade humana diante da manipulação promovida por sistemas de comunicação em massa. O poder da propaganda é algo há muito conhecido. Não é à toa que foi cunhada a conhecida expressão: “propaganda é a alma do negócio”. Não importa quão bom seja o seu produto, se desejar ampliar o seu universo de consumidores, é preciso divulgá-lo. Devem-se ressaltar suas qualidades para que as pessoas possam dele ter conhecimento e, assim, desejar adquiri-lo. Ou seja, é pela comunicação que as qualidades ou os defeitos de um bem ou serviço colocado à disposição vêm ao conhecimento público, expandindo ou retraindo seu sucesso comercial. Entretanto, essa comunicação, quando realizada pela Internet, amplia em escala geométrica a capacidade de influenciar os indivíduos, haja vista que multiplica o poder de divulgação, elevando-o a um patamar outrora inimaginável. Mas estamos falando apenas de produtos e serviços. Existem muitos outros campos em que a propaganda é de fundamental importância. A propaganda de ideias não é nenhum assunto novo. Sabemos que, na época da Guerra Fria,[14] na qual digladiavam os blocos capitalista e comunista, as propagandas ideológicas de ambos os lados eram bastante importantes no propósito de disseminar a ideia de que “aquele” determinado sistema econômico ou político era o mais eficiente. O esporte foi um dos instrumentos de propaganda mais eficientes na luta entre os blocos antagônicos. Quem não se lembra das olimpíadas ocorridas no apogeu das disputas ideológicas, nas quais tanto os Estados Unidos quanto a União Soviética, dentre outros,[15] se empenhavam em demonstrar a sua superioridade? Os resultados deixavam o mundo inteiro boquiaberto com sucessivas quebras de recordes e assombroso desempenho em relação aos demais países. E o que falar de um país insignificante como Cuba em termos de extensão territorial e população, com resultados tão expressivos no campo dos esportes?[16] Poderosas empresas tais como o Google,[17] o Facebook,[18] o Youtube,[19] o Twitter[20] e o Instagram,[21] dentre outras, perceberam a importância do que tinham em mãos: uma quantidade gigantesca de informações secundárias sobre o comportamento de bilhões de usuários, que, analisadas por meio de inteligência artificial, única forma de lidar com essa massa gigantesca de dados, poderiam não só explorar comportamentos, mas prevê-los e até mesmo modificá-los. E essa percepção conduziu à utilização desse poder em um nível ainda mais ousado. 4 Manipulação política Existem empresas especializadas na chamada “mineração e análise de dados” para sondar realidades, prever possibilidades e influenciar os resultados. Podemos citar como exemplo a Cambridge Analytica, criada em 2013. Em 2014, essa empresa teria participado de 44 (quarenta e quatro) campanhas políticas.[22] A C.A. ganhou destaque em 2015, trabalhando com análise de dados e inteligência estratégica na campanha presidencial de Ted Cruz (republicano), nos Estados Unidos da América, o qual desistiu da campanha eleitoral em maio de 2016, após os resultados desfavoráveis nas prévias do seu partido. Essa empresa seria de propriedade de Robert Mercer e presidida, em 2016, por Steve Bannon, então principal assessor de Donald Trump. Nesse ano, a C.A. aperfeiçoou seus algoritmos e trabalhou para a campanha presidencial de Donald Trump. Segundo o jornal britânico The Guardian, na Europa, a empresa teria sido contratada pelo grupo que promovia o Brexit (saída do Reino Unido da União Europeia), mas essa informação foi negada pela C.A.[23] Até hoje essas campanhas são objeto de investigação.[24] A acusação é de que a C.A. teria comprado acesso a informações pessoais de usuários do Facebook, utilizando-as de modo a influenciar as escolhas dos eleitores. Segundo as investigações, foi desenvolvido um aplicativo que, mediante respostas dadas voluntariamente a uma “enquete”, coletava informações reveladoras de tendências políticas. O aplicativo utilizado teria se aproveitado de uma brecha de segurança do Facebook, coletando também dados de amigos das pessoas que respondiam à enquete.[25] A influência da propaganda nos hábitos de consumo dos indivíduos é um fato. Com a propaganda, novas necessidades são criadas todos os dias. Entre marcas de qualidade semelhante, sobressai aquela que investe nas melhores campanhas publicitárias. Quantos de nós não somos capazes de relembrar ao menos de uma dúzia de slogans e jingles de sucesso, que trazem imediatamente à lembrança determinados produtos? Como foi largamente demonstrado na época da Guerra Fria, também as ideologias são produtos que, como quaisquer outros, podem ser “dourados” para parecerem mais belos, saborosos ou atrativos do que efetivamente são. O mesmo se pode dizer de políticos. Quem não se lembra da imagem do jovem e tempestuoso Fernando Collor de Mello, que buscava sempre ter sua imagem associada à juventude, à virilidade, ao esporte e a tudo o que representasse a força da renovação? E a mídia gostava de “vender” essa imagem: a do “caçador de marajás”, cujos alegados objetivos foram rapidamente abandonados após o êxito na eleição. Sem o objetivo de defender ou atacar qualquer dos candidatos à Presidência da República na eleição de 1989, tratando a questão com a necessária objetividade científica, é paradigmático o vídeo no qual o empresário do ramo de comunicações Boni,[26] então diretor da Rede Globo de Televisão, revela, em um programa de entrevistas datado de 26.11.2011, que deliberadamente teria contribuído em uma encenação para auxiliar no desempenho de Collor no debate contra seu adversário Luiz Inácio da Silva. Para tanto, teria se valido da utilização de glicerina para simular suor, a fim de minimizar a “aura burguesa” do candidato do Partido da Renovação Nacional (PRN), como um ardil de manipulação psicológica, objetivando aproximá-lo mais do povo. Além disso, afirmou que colocaram no cenário várias pastas com supostas denúncias contra Lula, as quais estariam vazias ou apenas com papéis em branco. Boni chega a dizer que iria simular também um pouco de caspa em Collor, mas este teria se negado a aceitar essa sugestão.[27] Em uma outra oportunidade,[28] Boni, em 18.03.2016, reafirma o que já havia revelado, acrescentando novos detalhes, inclusive acerca de uma edição do debate que teria favorecido o postulante Fernando Collor, que seria o favorito do presidente das Organizações Globo à época, o jornalista Roberto Marinho. É importante ressaltar, porém, que esses fatos foram negados por Fernando Collor de Mello em entrevista posterior, datada de 23.07.2020, sem nenhuma veemência, contudo.[29] Ainda que o inconfidente tenha buscado minimizar os possíveis efeitos do auxílio prestado ao candidato no sentido de transmitir uma imagem mais próxima do povo e buscado diminuir o desempenho do outro concorrente, a história é bastante reveladora quanto ao fato de que as emissoras de TV e os demais canais de comunicação em massa não são, como ingenuamente se pretendia, agentes imparciais do processo. Todos têm suas preferências e opiniões, sendo ingênuo que não se cuide de mecanismos que estejam acima das pessoas para que se busque obstar qualquer tipo de manipulação. 5 “Bolhas” de verdades segmentadas e liberdade de expressão a) “Bolhas” de verdades segmentadas O documentário O dilema das redes revela ainda uma outra realidade curiosa e ao mesmo tempo preocupante. A inteligência artificial expressada nos algoritmos utilizados nas redes sociais aplica um conceito que resulta na apresentação sistemática de assuntos relacionados à linha de pensamento manifestada pelo internauta. É muito comum, por exemplo, o usuário executar uma determinada música no Youtube, o que resulta na automática e sucessiva indicação de conteúdo similar àquele inicialmente executado. Quem executa uma música dos anos sessenta de repente se vê às voltas com dezenas de indicações relacionadas que, se não interrompidas, executarão incessantemente as “sugestões” de conteúdo da plataforma de entretenimento. Com as linhas de pensamento político-ideológico se dá o mesmo. Quem costuma assistir a vídeos relacionados a uma determinada corrente de pensamento político será contemplado com um sem-número de sugestões de material similar, seja do mesmo canal voluntariamente acessado, seja de outros que adotem linha editorial semelhante, convenientemente identificados e catalogados pelos algoritmos de inteligência artificial devido a centenas, milhares e milhões de acessos analisados que apontam para essa vinculação, resultando no direcionamento de materiais que apenas reforçam as convicções do usuário. Pelo exposto, resta claro que o usuário passivo das redes sociais, que se contenta em assistir apenas aos conteúdos sugeridos, acaba por perder contato com discussões que poderiam servir para amadurecer sua forma de pensar. Afinal de contas, ao viver em uma bolha em que só se falam e se ouvem os mesmos pontos de vista, a repetição das mesmas “verdades” acaba fazendo parecer, artificialmente, que há homogeneidade de pensamento sobre certo tema polêmico, ensejando estupefação quando se constata o contrário no mundo real. b) Censura algorítmica Mas ainda há um outro fenômeno que implica restrições ao pleno diálogo de ideias, do qual poderia surgir um posicionamento mais amadurecido. Trata-se de uma prática que se poderia chamar de censura algorítmica, sucessora da censura analógica, com nova roupagem tecnológica e com agentes distintos dos tradicionais. As poderosas ferramentas de busca podem ser “calibradas” mediante o uso de algoritmos, tanto para prestigiar determinados resultados, quando há patrocínio por parte de alguma empresa que pretenda que seus produtos encabecem as listas de pesquisa, como para não exibir certos conteúdos relacionados ao objeto de escrutínio, atendendo ao propósito de fazer reverberar apenas a forma oposta de pensar, gerando a falsa percepção de que há univocidade de opiniões acerca de certa temática. Sob outra perspectiva, faz-se necessário salientar que a liberdade de expressão é um valor bastante importante em nossa sociedade, encontrando-se expressamente prevista na Constituição Federal, art. 220: TÍTULO II DOS DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS CAPÍTULO I DOS DIREITOS E DEVERES INDIVIDUAIS E COLETIVOS Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: [...] IX – é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença; [...] TÍTULO VIII DA ORDEM SOCIAL [...] CAPÍTULO V DA COMUNICAÇÃO SOCIAL Art. 220. A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo, não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição. § 1º Nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social, observado o disposto no art. 5º, IV, V, X, XIII e XIV. § 2º É vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística. [...] É importante destacar que a Carta Constitucional de 1988 veio atender aos clamores de uma população que vinha de um regime de governo no qual a plena liberdade de expressão era tolhida, havendo controle dos meios de comunicação, que precisavam do aval de censores do governo militar para que determinadas ideias pudessem ser publicadas. Além disso, a verdadeira liberdade implica a necessária maturidade para se conviver com as diferentes visões de mundo. Não há liberdade quando se tolhe o direito de outras pessoas de manifestar reflexões contrárias às ideias defendidas por determinado segmento da sociedade. A liberdade não pode ser seletiva. Portanto, liberdade de expressão implica necessariamente também saber ouvir opiniões que divergem um pouco e até diametralmente da nossa. Quando alguém vem a público defender a descriminalização do uso e do porte da maconha, por exemplo,[30] em uma interpretação leiga do art. 33, § 2º, da Lei nº 11.343/2005 (Lei Antidrogas),[31] estaria induzindo ou instigando pessoas a utilizarem o entorpecente. Não é esse, porém, o entendimento da Suprema Corte, que vem debatendo o tema há anos.[32] O ordenamento jurídico está em constante aperfeiçoamento. Não podemos esquecer que o adultério já foi considerado crime até 2005, quando a Lei nº 11.106[33] revogou o art. 240 do Código Penal. Também não podemos jamais olvidar que até mesmo a escravidão era defendida com o argumento de sua previsão legal, somente revogada pela Lei nº 3.353/1888.[34] A sociedade deve e precisa debater constantemente o seu desenvolvimento. Existe uma famosa frase, comumente atribuída a Voltaire,[35] que sintetizaria o respeito que o filósofo nutria acerca da liberdade de expressão: “Não concordo com uma palavra do que dizeis, mas defenderei até a morte o direito de dizê-la”.[36] c) Responsabilidade das redes sociais e dos aplicativos pelo conteúdo compartilhado A princípio, na Internet, ao menos nos países democráticos, vigora a liberdade de expressão. Afirma-se que nesse universo virtual se daria a máxima expressão da inexistência de amarras às ideias, havendo responsabilização pessoal do transgressor apenas nos casos de cometimento de condutas criminosas ou lesivas. Porém, encontra-se em discussão[37] quais seriam os limites da responsabilidade das empresas Facebook, WhatsApp (que pertence ao Facebook), Twitter, Instagram, Youtube e congêneres acerca do conteúdo disponibilizado em suas plataformas. Seriam essas empresas meras depositárias e distribuidoras de conteúdo alheio, sem responsabilidade sobre o uso abusivo das redes? Analisemos, por exemplo, a atuação da empresa responsável pelo aplicativo WhatsApp. Há anos, ela vem se recusando a fornecer acesso a mensagens trocadas por criminosos investigados em inquéritos policiais. Em razão disso, o país assistiu ao bloqueio judicial do uso do aplicativo, para tentar forçá-lo a repassar dados para investigações em andamento. Contudo, nessa queda de braço entre as autoridades policiais e a empresa responsável pelo aplicativo, venceu esta, respaldada pelo clamor das multidões, que se viram órfãs quando tiveram o acesso à ferramenta bloqueado.[38] Também as tentativas de obter resultado por meio da imposição de multas foram inexitosas, mesmo com a fixação de valores milionários.[39] A questão ainda pende de decisão final, mas a tendência do Supremo Tribunal Federal (STF) se mostra favorável à opção pela proteção ao sigilo em detrimento de outros valores.[40] No entanto, a mesma empresa manifesta um comportamento contraditório: de um lado, tão ciosa em relação à proteção do sigilo, mesmo na investigação de crimes graves, de outro, passou a limitar o número de vezes que uma mensagem qualquer possa ser compartilhada, sob o pretexto de frear a disseminação de fake news,[41] apenas com base no fato de a mensagem em curso possuir um histórico de múltiplos compartilhamentos.[42] d) Cultura do cancelamento Outro aspecto a ser devidamente analisado diz respeito à chamada “cultura do cancelamento”[43] do usuário, que pode perder seu status de influenciador digital. Caso o “youtuber”,[44] o “instagrammer”[45] ou o “tuiteiro”[46] venha a publicar algum conteúdo polêmico ou que não esteja alinhado com a forma de pensamento adotada pela empresa proprietária da plataforma de comunicação utilizada, poderá simplesmente ter seu acesso bloqueado e seu conteúdo total ou parcialmente excluído. Apesar do aparente consenso generalizado em torno da liberdade de expressão, estamos nos acostumando hoje em dia a entender que “determinadas pessoas” não deveriam ter tanta liberdade, especialmente pelo fato de estarem a propalar pensamentos que divergem de uma determinada linha de pensamento ou de comportamento. Recentemente, ganhou notoriedade a exclusão do ex-presidente dos Estados Unidos da América Donald Trump da rede social Twitter. Segundo a plataforma: “Após criteriosa análise dos tweets recentes da conta do presidente Donald Trump e do contexto em torno deles, suspendemos permanentemente seu perfil diante do risco de mais incitações à violência”.[47] Ressalte-se que a sua suspensão da plataforma já havia ocorrido ainda na condição de presidente daquele país, o que demonstra claramente o poder das empresas por trás dessas redes sociais, que, além de possuírem receita superior à de muitos países, são capazes de efetuar julgamentos e condenações acerca dos comportamentos que julgam inadequados, independentemente de qualquer manifestação do Poder Judiciário, sem oportunidade de contraditório ou de ampla defesa. Sua autoridade vai além dos tradicionais poderes da república. A reflexão que nos resta é que as grandes redes sociais têm o poder de excluir conteúdos que entendam “inadequados” e “cancelar” indivíduos que apresentem discursos que confrontem suas ideologias de preferência. Tem sido apontado que artigos, notícias e dados atinentes a determinados pontos de vista “desaparecem” na rede. Veja-se sobre o tema o estudo do professor Silveira: RESUMO O Facebook é apresentado como uma plataforma de relacionamento social online transnacional em que ocorrem debates e interações públicas. O texto traz um levantamento sobre o controle privado das expressões culturais e políticas realizadas pelos gestores da plataforma, que pode ser definido como censura privada. Casos de remoção de conteúdo são apresentados, e são expostas as políticas de controle do Facebook. O texto mostra ainda que as regras do Facebook trazem fortes componentes discricionários e uma estética que pode ser apresentada como um tipo de biopolítica da sociedade informacional.[48] Censura praticada pelo governo é péssimo. Censura praticada por entes privados, com a anuência tácita e subserviente da sociedade, pelo simples fato de discordar do que é falado, não se distancia de qualquer tipo de censura já praticado. Na verdade, é ainda pior, porque as decisões sobre eventual supressão de determinadas opiniões agora ficam restritas aos interesses de uns poucos entes privados, e não mais de uma estrutura pública de poder. Evidentemente, o abuso da liberdade deve sofrer as devidas implicações legais. Entretanto, entregar a autoridade para realizar esse tipo de avalição nas mãos das grandes empresas privadas multinacionais, incluindo o poder de execução da decisão, é bastante temerário. 6 Raciocínio crítico Aristóteles, como já referido, em sua vasta produção filosófica, agraciou a humanidade com um conjunto de livros voltados ao estudo da lógica, conhecido como Órganon, composto por seis obras: Categorias,[49] Da interpretação,[50] Analíticos anteriores,[51] Analíticos posteriores,[52] Tópicos[53] e Refutações sofísticas.[54] Este último tratado lógico cuida dos sofismas, das anfibologias e das falácias. As falácias são raciocínios falhos que são tomados como verdadeiros[55]: Termo com que os escolásticos indicaram o “silogismo sofístico” de Aristóteles. Pedro Hipano disse: “Falácia é a idoneidade fazendo crer que é aquilo que não é, mediante alguma visão fantástica, ou seja, aparência sem existência” (Summ. Log., 7.03). Aristóteles dividira os raciocínios sofísticos em duas grandes classes: os atinentes ao modo de expressar-se, ou, como dizem os escolásticos, in dictione, e os independentes do modo de expressar-se, ou extra dictionem. Os primeiros são seis, a saber: equivocação, anfibologia, composição, divisão, acentuação, figura dictionis. Os outros são sete: acidente, secundum quid, ignorantia elenchit, petição de princípio, no causa pro causa, consequente, interrogação múltipla (El. Sof., 4). [...] Conforme nos demonstram esses escritos milenares, o convencimento a partir de estratagemas que falseiam a verdade é tão antigo quanto a humanidade. Quando assistimos a filósofos, humanistas e grandes líderes divulgando suas ideias e as vemos debatidas e implantadas, somos tomados pelo sentimento de que a humanidade dá um salto em seu processo evolutivo. Infelizmente, porém, as pessoas não se deixam levar apenas pelos líderes positivos. Também os líderes negativos arrebanham multidões para a propagação de ideias retrógradas, egoístas e cruéis. Hoje, mais do que nunca, a necessidade de identificar a utilização desses estratagemas se torna vital. Vivemos uma época em que pululam os “formadores de opinião” de conteúdo intelectual bastante duvidoso. Adolf Hitler inegavelmente foi um grande líder, que unificou o sentimento do povo alemão para uma retomada do crescimento econômico. Entretanto, mesclou o sucesso econômico, associado a avanços tecnológicos, com terríveis preconceitos, ideias distorcidas de superioridade e uma perversidade sem precedentes. Por outro lado, os ensinamentos de Jesus Cristo transformaram a humanidade e nos permitiram chegar a um estado de civilização e humanismo impensáveis na Antiguidade. Mahatma Gandhi, por sua vez, conquistou o mundo com uma estratégia de resistência pacífica que fez ruir o domínio britânico sobre seu povo. Martin Luther King, com seus discursos de resistência a um sistema opressor, mediante o uso do direito e das manifestações pacíficas, selou grandes avanços para a conquista da igualdade racial nos Estados Unidos e no mundo, tendo sacrificado sua vida em prol desse ideal. A população mundial, porém, cresceu muito e, proporcionalmente, a quantidade de pessoas de influência. E já não são apenas filósofos, reis, presidentes e políticos em geral as pessoas capazes de interferir no pensamento e no comportamento de um grande número de pessoas: músicos, atores, escritores e artistas de modo geral há muito tempo já possuem seus nichos de influência. Como disse John Lennon, em uma entrevista em março de 1966, os Beatles eram mais populares que Jesus Cristo em sua época.[56] E por “populares” leia-se influenciadores, seja do modo de vestir, seja do modo de cantar, de pensar, em suma: de viver. Mas hoje os “influenciadores” já não se restringem a uma meia dúzia de pessoas de projeção, por seus dotes morais, intelectuais, esportivos, artísticos, etc. Hodiernamente, um influenciador pode ser, com o perdão dos milhões de indivíduos talentosos que grassam nas redes sociais, a pessoa mais inepta e desajustada possível, já que sempre haverá à sua disposição um grupo de ouvintes, conectados quase que ininterruptamente às redes sociais, desejando saciar sua sede de novidades, em busca de alguém que lhes diga o que fazer e até mesmo o que pensar. Há uma proliferação enorme de canais voltados aos mais diversos interesses: humorísticos, religiosos, musicais, culinários, de investimentos, de entretenimento, etc. Não há um único segmento de interesse humano sobre o qual a rede das redes não tenha estendido seus tentáculos. Entretanto, dentre os múltiplos assuntos em permanente fluxo na Internet, nos tempos atuais há um em especial que vem ganhando cada vez mais vulto: os canais sobre política. Nunca se discutiu tanto sobre política como hoje. E política de modo amplo, incluindo o conhecimento sobre a forma e a estrutura de todos os poderes da república. Hoje as pessoas estão muito mais conscientes sobre o papel de cada um desses poderes. Pode-se perguntar em qualquer bar ou padaria que provavelmente qualquer um dos presentes será capaz de dizer o nome de ao menos dois ou três ministros do Supremo Tribunal Federal, o que outrora era de conhecimento apenas de um estrito público de profissionais da área. Mas, infelizmente, esse conhecimento, via de regra, tem a profundidade de uma poça d’água, o que torna os neófitos extremamente vulneráveis a uma horda de influenciadores ineptos ou mal-intencionados. A melhor forma de combater o vírus das mentiras travestidas de informação que pululam nas redes é munir as pessoas de ferramentas para desarmar aqueles que se nutrem das mentiras que disseminam. Para isso, pretende-se apontar algumas das mais conhecidas falácias argumentativas, para auxiliar na sua imediata identificação e consequente repulsa. a) Argumentum ad hominem (argumento contra a pessoa) Esse estratagema de ocultação da verdade é um dos mais utilizados, pelo fato de que sua prática não requer habilidade, tampouco muito conhecimento. Em lugar de atacar a força dos argumentos do adversário, basta que se encontre alguma mácula de sua vida pessoal, real ou imaginária, para difamá-lo e, por via de consequência, retirar a credibilidade de qualquer raciocínio dele proveniente. Nas eternas discussões sobre capitalismo versus socialismo, volta e meia vem à tona o argumento de que Karl Marx seria um “vagabundo desocupado sustentado pela esposa”[57]: Karl Marx foi sustentado pela esposa por 16 anos enquanto escrevia “O capital”, até que ela ficasse pobre. Só teve um único emprego fixo em 64 anos de vida, e foi como correspondente do jornal “New York Herald” por breve período e que não resultava em quantias suficientes para manter a família. Embora estudioso de economia, era cronicamente irresponsável nas finanças pessoais e sempre passou necessidades. Em 1852, quando morava em Londres, sem ter mais para onde correr, Marx tentou penhorar alguns talheres de prata com o brasão da família da esposa quando o dono da loja, desconfiado daquela criatura de cabelos desgrenhados e mal vestida, chamou a polícia.[58] Ou seja, para atacar suas ideias, em lugar de demonstrar, pela força do raciocínio dialético, alguma fragilidade lógica em sua obra, opta-se por destruir a reputação do ideólogo. Um dos mecanismos suprarracionais que levam alguém a aderir ou não a determinada linha de pensamento passa pelo respeito que se tem pela figura do seu expositor. Quando se destrói essa empatia, a veracidade ou não da proposta passa a ser uma questão de somenos. b) Falácia do homem de palha (ou do espantalho) Outra estratégia falaciosa para se vencer um debate consiste em ignorar o argumento do adversário, substituindo-o maldosamente por uma versão distorcida daquele, e atacá-lo, em lugar de voltar-se contra o argumento verdadeiro. Vejamos como isso ocorreu em meio à disputa política ocorrida entre Fernando Collor de Mello e Lula no pleito presidencial de 1989, sempre paradigmático. Observe o conteúdo da fala do candidato do Partido dos Trabalhadores (PT)[59]: Lula: O problema do Nordeste não é um problema de cerca, de seca, é um problema de cerca. Daí por que defendi a reforma agrária, se não morreriam milhões e milhões de nordestinos, como está aí a imprensa dizendo que o IBGE afirmando que é possível até nascer uma sub-raça. Claramente o tema abordado pelo candidato revela uma preocupação quanto aos problemas vivenciados pelos nordestinos, fustigados pela seca e pela fome, defendendo uma política de reforma agrária. A menção ao surgimento de uma suposta “sub-raça” revela evidentemente uma preocupação, e não uma constatação. Entretanto, ardilosamente o adversário distorceu a fala do oponente, atacando algo que este não disse[60]: Collor: Eu quero de alguma maneira repelir essa insinuação de que nós sejamos sub-raça, até porque sub-raça eu não sou, como também acredito que meu adversário não seja sub-raça somente pelo fato de ter nascido no Nordeste. A prova de que não somos sub-raça, deputado, é que nós estamos aqui disputando a eleição presidencial, duas pessoas com origens no Nordeste. Interesses antagônicos disputam a exclusividade da virtude, quando, na verdade, parece que ambos ou todos os lados se valem em alguma medida da argumentação falaciosa. Vejamos outra delas. c) Argumentum ad metum (apelo ao medo) Trata-se de uma falácia argumentativa mediante a qual se pretende provar um argumento que, de regra, não resistiria a uma severa análise racional, utilizando-se da força do medo para convencer o interlocutor. O medo é o fator emocional que obnubila o pensamento e faz as pessoas agirem imbuídas da emoção e despidas da razão. O cenário político é sempre campo fértil para a utilização e a proliferação das falácias. Também a do medo já foi utilizada em diversas oportunidades. É impossível não se lembrar da campanha presidencial de 2002, em que disputavam Lula e José Serra. A atriz Regina Duarte gravou propaganda eleitoral defendendo seu candidato, José Serra, exaltando suas qualidades e externando seu medo em relação às consequências advindas da possível eleição do candidato do PT.[61] Também na campanha eleitoral de 2018, o apelo ao medo foi utilizado contra o candidato Jair Bolsonaro, ressaltando suas supostas tendências totalitárias, indicando, assim, a possibilidade de retrocesso em nossa democracia.[62] Igualmente vigora hoje essa falácia no que concerne a algumas das medidas tomadas em relação à pandemia da COVID-19. O medo gerado pela terrível doença faz com que grande número de pessoas tome atitudes contrárias à lógica, podendo servir de massa de manobra para os mais mesquinhos interesses políticos, na mais ignóbil acepção da palavra. Temos assistido a inúmeras imposições restritivas à liberdade que não encontram amparo no ordenamento jurídico. Todavia, em nome do medo, tem-se mostrado uma inacreditável tolerância a determinadas restrições de liberdade que em circunstâncias normais jamais seriam aceitas. A lógica prevalecente é a irracionalidade do medo. Como defender, por exemplo, o decreto da Prefeitura Municipal de Foz do Iguaçu – PR que exige teste negativo de COVID-19, feito no país de origem, para estrangeiros da vizinha Ciudad del Este – PY e até mesmo brasileiros para ingresso no município?[63] A Constituição Federal permite esse tipo de discriminação sem a observância de quaisquer formalidades? Os requisitos legais para tanto foram obedecidos? O fechamento das fronteiras de um país pode ser uma decisão tomada no âmbito de discricionariedade de um prefeito municipal? Não seria o medo que estaria sendo utilizado como justificativa supralegal para essas decisões? De outro lado, a Prefeitura Municipal de Montes Claros – MG exige que pessoas encontradas nas vias públicas apresentem documentos pessoais, comprovação de endereço residencial, nota fiscal da compra ou prescrição do medicamento adquirido ou a ser adquirido, atestado de comparecimento na unidade de saúde, carteira de trabalho, tíquete da passagem, entre outros documentos que justifiquem sua necessidade de locomoção urgente, sob pena de multa e ameaça de sanções de ordem penal.[64], [65] Os argumentos utilizados têm sua eficácia perante as pessoas de forma diretamente proporcional ao medo que a doença provoca. Quanto maior o medo do indivíduo, mais ele está propenso a aceitar a “lógica” apresentada. Quanto menor o medo, mais inconsistências jurídicas são rapidamente identificadas na utilização de tamanho poder por autoridades municipais. Outra falácia mais “genérica” no que diz respeito à exploração dos sentimentos é o “apelo à emoção”. d) Argumento ad baculum (apelo à força) Esta é a mais antidemocrática forma de imposição de determinadas ideias. Não chega sequer a ser um argumento, haja vista que se consubstancia na ameaça ou na efetiva utilização da força. Tivemos alguns exemplos recentes sobre a farta utilização desse mecanismo de imposição de vontade por parte do que deveria ser o guardião máximo da Constituição. É notório o episódio que ficou conhecido como Inquérito do Fim do Mundo, no qual o STF usurpou competências para capitanear um procedimento processual penal despido das formalidades que lhe são inerentes: Como contraponto, e na tentativa de frear abusos, surge a atuação do Supremo Tribunal Federal (STF), o órgão máximo do Judiciário, a última instância recursal, que, em nome de conter os abusos, instaurou um inquérito sui generis, em atitude também nunca antes vista, pois o Judiciário, reconhecidamente órgão imparcial e que deve zelar pela correta interpretação e aplicação da lei, de forma equidistante das partes interessadas, viu-se na condição de vítima, assim como também os ministros da mais alta corte do país, e, a partir daí, decidiu tomar as rédeas, instaurando o inquérito, conduzindo-o, nomeando a equipe de policiais federais encarregada da investigação, determinando diligências, decretando ele mesmo quebras de sigilo, buscas e apreensões, retirada de perfis das redes sociais, adotando medidas extremas previstas na lei das organizações criminosas. O argumento central para isso: a suposta omissão do Ministério Público Federal (MPF), que teria deixado de investigar, e a possibilidade prevista no artigo 43 do Regimento Interno do STF, que permite ao presidente instaurar inquérito quando se tratar de infração à lei penal “na sede ou dependência do Tribunal”.[66] Apesar dos evidentes abusos cometidos pela Corte Suprema, a indagação que remanesce é: quando o órgão máximo da Justiça de um país é o responsável por abusos e flagrante desrespeito à Constituição do país, a quem recorrer? Qualquer discussão racional sobre o mérito da questão fica prejudicada. Mesmo que luminares do conhecimento jurídico nacional e mundial sejam concordes em relação à ilegalidade do procedimento, a força, e não o argumento, é o que tem prevalecido. e) Negação do antecedente Essa falácia podemos apresentar da seguinte forma: Se A, então B. Não A, então não B. Podemos encaixar aqui o exemplo do movimento desarmamentista no país, que culminou no Estatuto do Desarmamento, Lei nº 10.826/2003.[67] Um dos argumentos apresentados foi o de que: A) armas de fogo são responsáveis por mortes; B) estabelecido isso, decorre que, ao se retirar as armas das mãos da população, consequentemente, não haverá mais mortes por arma de fogo. Há argumentos simples e argumentos simplórios. Simples são aqueles de clareza manifesta. Simplórios são aqueles que, com base em um raciocínio limitado de uma realidade complexa, pretendem resolver problemas intricados. É fato que uma arma de fogo realmente pode matar, porém, não é a única opção possível. Pode-se argumentar que uma faca também pode ser utilizada com esse desiderato. Entretanto, é bem pouco provável que vejamos campanhas para a extinção das facas, haja vista que sua utilidade é bem superior aos seus potenciais malefícios. Somente no que diz respeito à faca, pelo visto, somos capazes de refletir que não é a arma que mata, mas sim aquele que a empunha com esse objetivo. Outro grande defeito no raciocínio que prega essa solução para a contenção da violência é olvidar-se de que somente entregaram suas armas para o poder público os cidadãos cumpridores da lei. Aqueles que pretendiam e pretendem utilizá-las para a prática de ilícitos jamais o farão voluntariamente. As mortes por arma de fogo continuaram a ocorrer. Desarmamentistas e armamentistas discutem incessantemente a efetividade da medida, cada qual extraindo verdades contrapostas dos números apresentados.[68], [69] É claro que não existe apenas um argumento, seja em defesa, seja contra a medida. Entretanto, não é o objetivo do presente trabalho aprofundar-se no exame dessa complexa questão, servindo apenas de exemplo para a análise do raciocínio lógico. O exemplo também pode servir para a falácia non sequitur (não se segue que), já que a conclusão não se sustenta nas premissas. f) Apelo ao preconceito A Constituição Federal cuida com especial atenção desse tema que lhe é tão caro em alguns importantes dispositivos: PREÂMBULO Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembleia Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL. (destaquei) [...] Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: [...] IV – promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. (destaquei) [...] Mesmo assim, partiu da Corte Suprema de nosso país, a instituição mais insuspeita para esse tipo de comportamento contrário aos ditames constitucionais, uma argumentação, no mínimo, bastante polêmica[70]: ELEIÇÕES 2016. RECURSO ESPECIAL. VEREADORA. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. ABUSO DO PODER RELIGIOSO. PEDIDO DE ASSISTÊNCIA LITISCONSORCIAL. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE INTERESSE JURÍDICO DIRETO NA CAUSA. ASSISTÊNCIA SIMPLES. INTERESSE JURÍDICO REFLEXO. REUNIÃO REALIZADA NAS DEPENDÊNCIAS DE UMA IGREJA. PEDIDO DE APOIO. PROPOSTA DE FIXAÇÃO DE TESE PARA AS ELEIÇÕES 2020 E SEGUINTES. CABIMENTO DE AIJE EM FACE DE ABUSO DE PODER DE AUTORIDADE RELIGIOSA. MÁXIMA PROTEÇÃO DA LEGITIMIDADE DAS ELEIÇÕES. AUSÊNCIA DE GRAVIDADE. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. AGRAVO INTERNO PREJUDICADO. [...] 11. A imposição de limites às atividades eclesiásticas representa uma medida necessária à proteção da liberdade de voto e da própria legitimidade do processo eleitoral, dada a ascendência incorporada pelos expoentes das igrejas em setores específicos da comunidade. Dita interpretação finca pé na necessidade de impedir que qualquer força política possa coagir moral ou espiritualmente os cidadãos, em ordem a garantir a plena liberdade de consciência dos protagonistas do pleito. Jurisprudência estrangeira. [...] Em certa medida, não seria desarrazoado concluir que, segundo o Ministro Edson Fachin, os religiosos, de modo geral, seriam grupos extremamente vulneráveis no que diz respeito à capacidade de discernimento, merecendo especial tutela do Estado. Não obstante no caso concreto haver-se concluído pela não comprovação do abuso de poder de autoridade religiosa,[71] o episódio revela a possibilidade de que, no futuro, em um entendimento menos restritivo do que seria esse abuso, ele reste caracterizado e implique a nulidade do resultado do pleito eleitoral em que representantes de grupos religiosos sejam eleitos. O que chama a atenção é que o festival de horrores que costuma ser o horário eleitoral gratuito na TV, com campanhas bastante “estranhas”, não seja analisado com a mesma severidade que alcançou a candidatura evangélica. Veja-se, por exemplo, a campanha política do humorista Tiririca,[72] que baseou sua candidatura no escárnio às instituições. Apesar do tom extremamente jocoso de sua campanha, que explora o desencantamento dos eleitores com as instituições, esta culminou em sua eleição para a Câmara dos Deputados, pelo Partido da República (PR), em outubro de 2010, com 1.353.820 votos. Além de se eleger, o candidato Tiririca levou “de arrasto” mais outros candidatos da coligação à condição de deputados federais. Sua aptidão para o exercício do mandato foi impugnada por ser analfabeto, o que foi comprovado. Todavia, a Justiça Eleitoral, com confirmação pelo STF,[73] entendeu que o fato de o candidato ser apenas analfabeto funcional não seria motivo suficiente para a perda do mandato. Foi reeleito para o cargo em 2014, pelo mesmo partido, com 1.016.796 votos, elegendo consigo outros dois candidatos do partido [Capitão Augusto (46,9 mil votos) e Miguel Lombardi (32 mil votos)].[74] Nas eleições de 2018, foi reeleito deputado federal com 453.855 votos. Felizmente, essa distorção dos chamados “candidatos puxadores de votos” acabou sendo atenuada pela chamada cláusula de desempenho, estabelecida pela Lei nº 13.165/2015,[75] que prevê um número mínimo de votos para que um deputado federal, estadual ou distrital possa se eleger. Ou seja, não se pode questionar o voto fundado no escárnio, ou a flexibilização do significado de “alfabetizado”, sob pena de incorrer-se em preconceito, mas a eleição de representantes que defendem princípios e valores religiosos é submetida a crivo mais severo. É revelador, portanto, que o preconceito pode ser seletivo, atingindo apenas certos segmentos da pluralidade que representam nossos 147.918.483[76] eleitores aptos a votar, em atenção a motivos diversos, dentre eles, possível motivação ideológica. g) Invenção de fatos Esta é uma das mais comuns e perigosas falácias de hoje e de sempre. O uso exponencial das redes sociais aumentou grandemente o poder desse tipo de falácia, tornando-a a mais recorrente na atualidade. Somos o tempo todo bombardeados por notícias falsas. Essas fake news se manifestam de diversas formas: • narrativa falsa, apontando fatos que não ocorreram; • fatos ocorridos em lugar/país diverso do que aponta o texto, descontextualizando a relação causal; • fatos antigos, apresentados como novos, em contexto diverso; • fatos que têm distorcidas suas causas ou suas consequências; • apresentação de imagens associadas a determinada narrativa, mas dissociadas da realidade subjacente; • falsos especialistas comentando dados técnicos sem base científica; • profissionais da área comentada que expressam suas opiniões, apresentando-as como dados científicos. As formas de disseminação dessas falsas notícias são as mais diversas, que vão desde a utilização dos meios de comunicação tradicionais – rádio e televisão – até o uso dos modernos canais, tais como Youtube, Twitter, WhatsApp, Instagram, etc. Contra essa propagação de inverdades, há algumas iniciativas, consubstanciadas em alguns sites especializados em investigar mais a fundo essas notícias, muitas vezes revelando a verdade.[77] Todavia, é importante salientar que também há canais de verificação da idoneidade de notícias que são patrocinados por determinada linha ideológica, o que compromete sua credibilidade. A exposição acima inclui outra conhecida falácia, que é a distorção de fatos. h) Falsa dicotomia A exploração maliciosa da argumentação, apresentada com raciocínio deturpado, pode ocorrer de inúmeras formas, como já apresentado. Ainda há um grande número delas, mas acreditamos que o objetivo de demonstrar os riscos de sucumbirmos a raciocínios rasos na avaliação dos acontecimentos já foi devidamente atingido. Entretanto, entendemos necessária a apresentação de mais uma última falácia, deixada por último justamente com o propósito de ressaltar sua importância. Trata-se da falácia da falsa dicotomia. Segundo esse raciocínio enviesado, diante de uma determinada situação em que deveríamos identificar a verdade, somente teríamos as opções A ou B. Se você discorda de A, então você concorda integralmente com B ou vice-versa. É o que temos vivido nestes tempos de polarização de ideias. Tenta-se impor a ideia de que somente existe “preto ou branco”. Tal forma de enxergar a realidade esquece que a natureza humana é muito mais complexa do que esse raciocínio binário, havendo, na verdade, nuanças quase infinitas de cinza entre um e outro extremo. Aristóteles já nos ensinava, em Ética a Nicômaco, que a virtude se encontra no justo meio entre os extremos: Falo da virtude moral, pois é ela que se relaciona com as paixões e ações, e nelas existe excesso, carência e um meio-termo. Por exemplo, pode-se sentir tanto o medo, a confiança, o apetite, a cólera, a compaixão, e de uma forma geral o prazer e o sofrimento, em excesso ou em grau insuficiente; e, em ambos os casos, isso é um mal. Mas senti-los no momento certo, em relação aos objetos e às pessoas certas, e pelo motivo e da maneira certa, nisso consistem o meio-termo e a excelência característicos da virtude. De modo análogo, também existe excesso, carência e um meio-termo no que diz respeito às ações. Ora, a virtude relaciona-se com paixões e ações em que o excesso é uma forma de erro, tanto quanto a carência, enquanto o meio-termo é uma forma de acerto digna de louvor; estar certa e ser louvada são características da virtude. Por conseguinte, a virtude é uma espécie de mediania, já que, como vimos, o seu alvo é o meio-termo.[78] Em sentido semelhante ao pensamento de Aristóteles, Siddharta Gautama[79] descobriu o que os budistas chamam de “caminho do meio”, o caminho da moderação, afastado dos extremismos da autoindulgência e da automortificação. A virtude está no meio, e não nos extremos.[80] Portanto, é perfeitamente possível encontrar um ponto de equilíbrio no embate entre duas ideias distintas. Considerações finais Ao longo da presente exposição, tivemos oportunidade de analisar alguns aspectos relativos à forma como as modernas tecnologias têm nos influenciado. Em um primeiro momento, com interesses meramente econômicos, no sentido de ofertar mais e melhores produtos e serviços de maneira mais eficiente e eficaz. Contudo, o sucesso no desenvolvimento de estratégias para atender às demandas existentes e identificar novas exigências levou-nos a um patamar mais elevado: a previsão de novas necessidades. Mas não pararam por aí as inovações no campo da análise comportamental. A partir do momento em que a utilização de algoritmos de inteligência artificial foi se desenvolvendo, percebeu-se que se poderia ir além: influir nos hábitos de consumo dos indivíduos. Dominada essa nova área de conhecimento, cogitou-se ainda um novo patamar: a influência política. As redes sociais são ferramentas poderosas para tal desiderato. Sua forma de atuação é, muitas vezes, sutil e sub-reptícia. Muitas vezes somos convencidos mediante argumentos que, em uma primeira análise, podem ser razoáveis. Todavia, em uma avaliação mais aprofundada, somos capazes de identificar as técnicas de convencimento que são utilizadas por pessoas inescrupulosas para o atingimento dos mais diversos fins. Somente conhecendo as ferramentas de identificação dessas estratégias é que os indivíduos serão capazes de, mediante uma análise percuciente dos fatos e dos argumentos, chegar à melhor e mais refletida decisão sobre quaisquer assuntos. Para auxiliar nesse processo, trouxemos algumas dessas ferramentas que há milênios já são do conhecimento da humanidade, as quais foram consolidadas por Aristóteles na Antiguidade e periodicamente retomadas por outros grandes pensadores ao longo da evolução da civilização. A resultante dessas reflexões é a manutenção de um permanente estado de alerta da consciência para que não nos deixemos envolver pelos estratagemas de argumentação que nos incitam falhas de raciocínio e nos conduzem a decisões mal refletidas na nossa permanente trajetória em busca do autoaperfeiçoamento, seja como membros de uma coletividade, seja na condição de indivíduos. Referências ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia. 4. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2000. ARISTÓTELES. 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