Associação, construtora e Caixa são condenadas por vícios de construção em moradias em terra indígena
Atualizada em 02/05/2024 - 12h49
A 1ª Vara Federal de Ijuí (RS) condenou uma construtora, uma associação e a Caixa Econômica Federal pela má execução na construção moradia – financiadas pelo Programa Nacional de Habitação Rural (PNHR) – em comunidade indígena localizada em São Valério do Sul (RS). Em sentença publicada em 26/4, a juíza Clarides Rahmeier observou que ficaram demonstrados os vícios de construção na instalação do sistema de esgoto e de tratamento, condenando as rés à reparação do dano.
O Ministério Público Federal (MPF) ingressou com ação narrando que a associação, na condição de entidade organizadora, a construtora contratada para realizar a obra e a Caixa, agente financeira da operação, teriam sido responsáveis pela má execução das obras realizadas na Terra Indígena de Inhacorá. Uma diretora da associação, o sócio-proprietário da construtora e duas arquitetas contratadas também foram acusados de terem envolvimento nos problemas de execução das moradias. O MPF requereu a reparação das falhas de execução e o pagamento de R$ 400 mil à comunidade indígena por danos morais coletivos.
Em sua defesa, os réus relataram sua versão dos fatos, defendendo a improcedência do pedido.
Ao analisar o caso, a juíza verificou que o PNHR é um programa que faz parte do Programa Minha Casa Minha vida, tendo por finalidade subsidiar a construção ou a reforma de imóveis de trabalhadores rurais através de repasses coletivos de recursos. Para que o programa seja executado, é preciso que os trabalhadores estejam organizados coletivamente, sendo necessária a presença de uma entidade organizadora. No caso, a função foi assumida pela associação acusada.
A magistrada observou que o contrato celebrado junto à Caixa previa a construção de 97 moradias familiares, representando investimento de R$ 2.425.000,00, representando R$ 25 mil por habitação. Para a construção, a associação contratou a empresa denunciada em novembro de 2012 e duas arquitetas em janeiro de 2013. Após as entregas das obras, em julho de 2015, foram relatados vícios construtivos no sistema hidrossanitário em relatório de vistoria da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai). Segundo o documento, puderam ser encontrados “erros grotescos referentes a boa técnica e execução junto ao sistema de tratamento e esgoto”. O relatório ainda concluiu que problema sanitário foi agravado devido à má conservação das unidades habitacionais de seus moradores.
Para a juíza, as provas apresentadas permite concluir a existência de vícios e inadequações quando da execução do projeto. Ela afirmou ainda que houve omissões e falhas quanto à manutenção e conservação das moradias, que também foram observadas durante a inspeção judicial realizada.
Rahmeier pontuou que a baixa quantia despendida pelo programa para a obra também impactou negativamente na qualidade das moradias. “Nesse contexto, e considerando que não se mostra legítimo fixar obrigação de reparação superior às obrigações assumidas, atribuindo aos réus o suprimento de omissões do próprio programa habitacional, bem assim de danos e deteriorações surgidos de sua utilização, tenho que a reparação deve observar parâmetros reais e possíveis, e não aquilo que corresponderia a um cenário ideal”, concluiu.
Para a magistrada, as responsabilidades da construtora e da associação ficaram comprovadas, assim como as da Caixa, que não realizou o devido acompanhamento de obras. Por outro lado, ela não identificou elementos que comprovassem que a diretora da associação e o sócio-proprietário da construtora agiram com desvio de finalidade.
“Por fim, tenho que a responsabilidade das arquitetas responsáveis pela elaboração do projeto deve ser afastada, notadamente pelo desligamento em momento anterior ao fim da obra, em termos, inclusive, aparentemente conflituosos, a apontar para possível inexistência de efetiva autonomia técnica que às permitisse verdadeira liberdade de atuação no caso”.
Quanto aos direitos morais coletivos, ficou evidenciada, para Rahmeier, que os valores que fazem parte da cultura indígena foram ofendidos. A juíza destacou que a comunidade teve a expectativa por uma melhora em sua condição social quebrada pelos problemas da entrega. Verificou que a responsabilidade por zelar pela qualidade das moradias entregues cabia à Caixa, impondo a esta o dever de indenização.
A juíza julgou parcialmente procedente a ação condenando a associação, a Caixa e a construtora à elaboração e execução de uma proposta reparação e compensação dos problemas identificados na execução das moradias. A Caixa ainda foi pagará R$ 50 mil por danos morais coletivos a serem revertidos em projetos envolvendo melhorais das condições de habitação da comunidade.
Cabe recurso ao TRF4.
Secos/JFRS (secos@jfrs.jus.br)
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